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Creches: quais os critérios para a escolha?

Creches: quais os critérios para a escolha?

 

Por Daniel Becker – Médico pediatra, palestrante e consultor. Autor do Pediatria Integral

Leia também: O que as crianças vão comer na creche hoje?

 

Muita gente se pergunta o que fazer na época em que a volta ao trabalho da mãe é obrigatório. É um momento sempre difícil, angustiante, sofrido.

Algumas famílias tem a sorte de contarem com um/a cuidador/a de confiança: uma avó, uma tia, uma ótima babá. Outras acabam por ter que deixar a criança numa creche – o que, como já repetimos muitas vezes, não traz maiores benefícios para o bebê antes de pelo menos um ano e meio de idade. Ao contrário, pode trazer diversos riscos e problemas – especialmente as infecções repetidas, que na criança mais jovem acabam muitas vezes se tornando mais sérias e deixando seqüelas com mais frequência.

Vários estudos pediátricos demonstram que é melhor aguardar até 12 ou 18 meses, quando possível. Mas quando a creche é inevitável – o que ocorre com freqüência cada vez maior – é importante procurar uma que preencha critérios mínimos de segurança e qualidade. Vamos pensar sobre alguns deles.

1 – Segurança deve ser o primeiro critério, claro. Verifique se há redes em todas as janelas e escadas, pisos anti-deslizamento nas áreas sensíveis, piscina – se houver – cercada e fechada, e com guarda-vidas e/ou professores durante seu uso, aparelhos e objetos pesados fora do alcance ou bem fixos à parede, cozinha e outras áreas de risco bem isoladas por portas apropriadas. Pergunte o que fazem em casos de emergência e acidentes – a resposta deve ser rápida e bem objetiva. Veja se há preparação para incêndios, extintores e plano de evacuação. Uma olhada nos equipamentos de playground também é importante: balanços e gangorras sobre pisos macios, sem ferrugem, sem pontas ou bordas que possam machucar, com boa manutenção. Crianças maiores e bebês não devem dividir o mesmo espaço, pelo risco de brinquedos com pequenas partes que possam se soltar, e do contato de uma criança mais forte e pesada com os pequenos.

A lista pode parecer extensa, mas são itens mínimos que devem ser verificados. Acredite: acidentes acontecem e são os piores eventos que podem ocorrer na infância. Prevenir é sempre melhor.

2 – Higiene e meio ambiente: vem junto com a segurança. Visite a cozinha e os banheiros em horários não programados (alias, a creche que não permite a entrada de pais fora de horários rígidos e programados de visita deve ser descartada, em princípio); observe a limpeza, a higiene, a forma como cuidam dos alimentos.

Há luz natural, os ambientes recebem um pouco de sol, são bem arejados? Há espaço de circulação? Na área para bebês, os berços devem ter idealmente cerca um metro de distancia um do outro.

Talvez muita gente não julgue importante, mas eu perguntaria como a instituição lida com resíduos: há separação de lixo, reciclagem? Afinal, as creches estão cuidando do nosso futuro; ali nossos filhos vão aprender sobre as questões ambientais, tão importantes para a sua geração. Um mínimo de coerência e integridade é necessário. Eu daria preferência para locais com reciclagem, espaço aberto, jardim e educação ambiental levada a sério.

3 – O número e postura das atendentes é muito importante. Para crianças menores de 18 meses, uma boa relação seria uma cuidadora para cada três crianças. Entre 18 meses e três anos, uma para cada quatro crianças. Qual é a formação das atendentes? Passam por alguma capacitação? O que acontece se uma adoece? Há quanto tempo trabalham lá? O bebê precisa de vínculo estável com seus cuidadores – houve muita rotatividade nos últimos meses? Não custa conversar com as professoras e auxiliares sobre estes temas.

4 – Observe a interação entre o pessoal da creche e as crianças. O ideal é que cuidadores estejam no chão brincando com as crianças ou segurando-as no colo. Os bebês precisam relações afetivas, próximas, e de interação um para um. A equipe parece desfrutar da interação e do cuidado? Você percebe alegria no ar, sorrisos de crianças e atendentes? Isso é muito importante.

5 – Uma afinidade com a filosofia educacional da creche é essencial. Verifique se há um projeto pedagógico, ou ao menos uma linha educativa. Veja se está de acordo com suas crenças pessoais e a de seu cônjuge. Há televisão? atenção – perigo: as crianças são expostas à TV a partir de que idade? Por quanto tempo? Não deve haver TV na área de bebês abaixo de 2 anos. Por outro lado, quanto mais cedo as crianças tiverem livros à mão, melhor. Finalmente, há bastante tempo dedicado a brincadeiras ao ar livre?

6 – Como é o cardápio? Almoço e jantar em geral não representam problemas. Preste atenção nos lanches – é ali que mora o perigo. Considero um erro grave – e a maioria das creches o cometem – dar açúcar para bebês. E os lanches são povoados de “inocentes” geléias de mocotó, biscoitos maizena, Nestons e Mucilons, gelatinas, bolinhos e sucos adoçados. Baratos, de ótima aceitação, mas muito nocivos. “Comeu tudinho” – assim fica fácil. Aí chega em casa e não quer a fruta natural – que surpresa… Não é necessário envenenar desde o berçário. Melhor deixar o açúcar para as exceções, os momentos festivos, fora da rotina.

7 – Talvez um dos critérios mais importantes seja o número de crianças em cada sala. Na França, os limites são: até seis bebês menores de um ano, nove para crianças até 18 meses, e até doze até três anos. Aquela creche com dois anos de espera pode ter bem mais… Isso simplesmente aumenta o risco estatístico do seu filho ou filha serem contaminados por infecções. Quanto mais crianças na turma, mais doentes eles vão ficar. Simples assim. A ventilação aqui é muito importante também. E voltando à higiene: a lavagem das mãos ou o uso do álcool 70 diminuem as infecções. Se puder, verifique se estão acessíveis e são usados.

8 – Minha sugestão pessoal: prefira creches mais “caseiras”, onde os proprietários estão presentes e são acessíveis. Desconfie de creches com grandes departamentos de “marketing”, que fazem anúncios em ônibus ou outdoors, com filiais pela cidade toda, filas de dois anos para matrícula, arrotando tablets no berçário ou “ensino bilíngüe”. Ou, pior, desconfie de escolas de propriedade de personalidades de ética altamente duvidosa. Afinal, todos queremos que nossos filhos aprendam a ser gente.

Finalmente, confie em sua intuição. Se você sente um mal estar ou incômodo, mesmo que esteja na creche da moda, procure uma alternativa. Você não vai encontrar a perfeição – mas pode confiar sua filha ou filho à melhor creche possível, e aquela que tenha afinidade com sua visão de mundo.

Imagem: Freepik

Publicado originalmente no site Pediatria Integral