Festas em lojas de brinquedos: o que celebramos afinal?
Por Desirée Ruas – Jornalista, especialista em Educação Ambiental e Sustentabilidade
Quando a gente pensa que já viu de tudo, descobrimos que há muito ainda pela frente. Há sempre novas estratégias para incentivar o consumo e pressionar crianças e adultos também em datas comemorativas. Das festas em casa com bolo e brigadeiro feitos pela família – as da nossa infância – ou as festinhas nas escolas às produções em bufês infantis com a presença de super-heróis, mágicos, princesas e milhares de itens, e até festas em salões de beleza para meninas. Muitas variações para cantar “parabéns pra você”.
Felizmente, vemos muita gente trocando as festas caras e impessoais nos bufês para 500 pessoas por festas mais íntimas em casa, para um número menor de convidados. Além do retorno às festas em casa, temos agora também a moda das festas ao ar livre, em parques e praças, que aproximam a garotada do verde. Mas é sempre bom ter cuidado com os modismos. As pessoas embarcam na onda sem saber porque estão indo naquela direção e acabam perdendo o sentido da comemoração. Não entendo o motivo de uma família que quer uma festa simples em um parque na cidade contratar um bufê especializado em festas ao ar livre. Não era para ser simples? Não era para ser algo feito pela própria família com cuidado e amor? Por que uma festa no parque precisa ter quase todos os itens que encontramos nas festas em bufê?
Estar em um espaço com muita natureza deveria nos lembrar que copinhos com brigadeiro, pratinhos e milhares de descartáveis não combinam com festas assim e muito menos comida nada saudável. Excesso de convidados, lixo espalhado depois da festa ou famílias que acham que o parque é seu naquele dia nos fazem refletir sobre o uso dos espaços públicos para tais comemorações. Depois da crescente utilização dos seus espaços para festas, os parques começaram a adotar medidas como a exigência de autorização para os eventos. Quem decide fazer uma festa em local público deve estar preparado para receber bem os demais visitantes do parque, compartilhar o lanche, as brincadeiras, as lembrancinhas. Afinal, se o espaço tem que ser para todos e se um uso interferir nos demais usos, ele tem que ser repensado.
Um piquenique, um dia de brincadeiras, uma oficina de culinária, um dia de arte… Enfim, são tantas possibilidades para uma comemoração divertida, econômica, inesquecível e sem consumismo. Mas agora temos mais uma novidade: festa de aniversário dentro de lojas de brinquedos. E os convidados recebem junto do convite a lista de presentes que o aniversariante gostaria de ganhar. Fico me perguntando o que celebramos em um lugar assim? Celebramos a vida do aniversariante ou o consumo de brinquedos? Pesquisando pela internet, vi que a loja não cobra do aniversariante a festa e ainda dá uma comissão de 15% sobre os presentes comprados para ele pelos convidados. Pode ser que cada loja adote uma política diferente mas independente das regras de funcionamento da festa, a gente só pensa na pressão que isso exerce sobre o convidado. A criança quer apenas se divertir na festa do amiguinho e não ficar vendo brinquedos embalados e ficar desejando ter isso ou aquilo.
Listas de presentes costumam ser bem-vindas em festas de casamento já que os noivos geralmente estão montando uma casa nova e é bacana dar algo útil. Mas por que uma criança precisa de uma lista de presentes? Para não ganhar presente repetido? Pode trocar se for o caso ou dar para outra criança. A cultura do presente incentivada pelo mercado não significa uma demonstração de que gostamos daquela pessoa. Mostra que devemos seguir a regra e que pegará mal se formos a uma festa de mãos abanando. Mas por que precisamos presentear? O que de fato é um presente e qual o seu valor para quem dá e para quem recebe?
Mesmo em festas infantis é possível planejar uma outra forma de comemorar e de presentear. Pensando em alternativas que mostrem uma outra direção para os presentes de aniversário, existe a plataforma online Presente Consciente, que permite que as pessoas façam doações para instituições a pedido dos aniversariantes. Criado em maio de 2014, o site é um canal alternativo de captação de recursos para instituições sem fins lucrativos. Conhecendo as dificuldades de se captar verbas para instituições beneficentes, duas amigas, Ana Clara Schulman e Tamara Rothstein, resolveram unir forças para a causa. Elas contam que a dificuldade em captar recursos para uma ONG é enorme e com as facilidades da plataforma online o cenário para muitas instituições começa a ser modificado. Além disso, existe uma preocupação com a sustentabilidade e consumismo que provoca danos ao planeta.
Por menos aniversários em lojas de brinquedos e shoppings e mais comemorações simples e solidárias, eis uma reflexão para pais e mães que se preocupam com o consumismo na infância. Se você conhece outras formas de comemoração que merecem ser divulgadas, escreva para a gente e conte sua experiência.
Saiba mais sobre a colunista Desirée Ruas:
Sou jornalista, especialista em Educação Ambiental e Sustentabilidade, educadora ambiental, palestrante e ativista da infância. Atuo como multiplicadora em educação para o consumo desde 2004 divulgando temas como educação, mídia, cidadania e sustentabilidade. Moro em Belo Horizonte e faço parte da Rede Brasileira Infância e Consumo desde sua criação. Na Rebrinc pude me conectar a pessoas e movimentos que informam, refletem, questionam e inspiram pela construção de uma cultura do cuidado e da paz, pela infância e por todos nós.
Fale com a autora: contato@rebrinc.com.br
Texto feito especialmente para o site da Rede Brasileira Infância e Consumo, Rebrinc. Caso queira reproduzi-lo, pedimos que mencione a fonte e o autor, com link para o site. Ajude-nos a valorizar os autores e a divulgar o nosso trabalho pela infância.