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A proteção da infância e os conteúdos da mídia

A proteção da infância e os conteúdos da mídia

Por Raquel Moreno* – psicóloga, pesquisadora e integrante da Rede Brasileira Infância e Consumo

A criança vive um longo e lento processo de amadurecimento, em que começa achando que é um todo com o peito e a mãe e, aos poucos, vai percebendo os seus limites e os do outro, desenvolvendo uma relação de afeto e de individuação.

Nos primeiros anos, frente à mídia, a criança assiste fascinada a tudo que lhe mostram, acreditando que o que vê reflete a verdade.

Lembro de uma pesquisa com crianças, em que discutíamos uma embalagem de um novo chocolate a ser lançado, reproduzido num cartaz de dimensões confortáveis para a percepção de detalhes. Depois de devidamente avaliado, apresentei o produto em questão – um chocolatinho do tamanho de um Bis.

A decepção diante da redução do tamanho – da embalagem para o produto – me fez ver que as crianças acreditavam que o chocolate seria do tamanho do grande cartaz recém-avaliado.

Isso também remete ao caso do menino que, tendo recebido de presente uma roupa de super-homem, se vestiu, e pulou da janela do terceiro andar, crente de que voaria, como mostram os desenhos e a publicidade na TV.

Proteção da infância

Portanto, tanto levando em conta este processo de amadurecimento, quanto os direitos das crianças expressos em nosso ECA, são necessários cuidados especiais que caracterizem a proteção à infância. Entre esses, uma classificação indicativa, que sinalize aos pais, adultos ou à própria criança, que este programa é – ou não – adequado à sua idade.

Como o cuidado de nossas crianças cabe a todos nós, e não apenas aos pais, é fundamental que as emissoras sigam estas normas – evitando conteúdo sexual, violência ou drogas dentro da programação infantil.

Como a norma não proíbe a produção ou exibição de qualquer tipo de conteúdo – mas apenas disciplina e sinaliza a conveniência de horário e etária – não faz o menor sentido alegar que o sistema de Classificação Indicativa em curso no Brasil fere a liberdade de expressão das emissoras. Ela só disciplina e sinaliza a adequação em termos de faixa horária e público-alvo.

Adultização das crianças

As crianças brasileiras são as que assistem o maior numero de hora de TV por dia – em média 5 horas e 35 minutos por dia. E têm sido submetidas não só ao conteúdo do horário matutino e vespertino, como à publicidade exibida ao longo do dia.

Paralelamente, as crianças brasileiras têm sido as mais precocemente erotizadas – o que parece bastante compatível com o perfil das “garotas-propaganda”, das bonecas não mais infantilizadas mas erotizadas do tipo Barbie, além das roupinhas infantis anunciadas na mídia – soutiens com recheio para menina de oito anos, sandalinhas de salto para desde os quatro anos. E por aí afora.

Além disso, a sedução dos pais pela mídia tem sido responsável  por cenas familiares em que pais cansados da jornada de trabalho – fora e/ou dentro de casa – chegam, comem rapidamente (quando todo mundo não come em frente à TV), e o convívio familiar se transforma e reduz em assistir juntos a algum(s) programa(s) do horário adulto – já que este é um jeito de ficar mais perto dos filhos por um tempo adicional, preenchendo a falta de assunto com o tema comum da novela. E que passa rápida e distraidamente pelo jornal, com toda a dose de violência e valores que contém e veicula – mesmo que nele não conste “recomendado para a idade de ……!”.

 

Para saber mais: Classificação Indicativa

 

 

 

Rachel Moreno - Colunista Rebrinc

* Saiba mais sobre a colunista Rachel Moreno

Rachel Moreno é psicóloga, pesquisadora, especialista em sexualidade humana e em meio ambiente. É autora de “A Beleza Impossível – Mulher, Mídia e Consumo” (editora Ágora), e “A Imagem da Mulher na Mídia – Controle Social Comparado” (editora Publisher).

Atua desde 1974 pelas causas e direitos das mulheres (movimento por creche USP;  congressos de mulheres trabalhadoras;  organização dos congressos da mulher paulista;  Movimento de Luta por Creches SP; Jornal Nós Mulheres; fundação do SOS Mulher –1980). Além disso, participa de debates e da organização de grupos de reflexão e ação pelo país, discutindo direitos sexuais e reprodutivos, sexualidade, violência de gênero, educação, trabalho noturno feminino, condições de trabalho (salário diferenciado, nichos de informalidade, dupla jornada de trabalho); formação de PLPs. Hoje foca a transversalidade da questão de gênero – demandas e participação das mulheres nas questões de meio ambiente, saúde, transporte, trabalho, igualdade de oportunidades.

Desde 2006 tem também militado pela democratização da mídia, com publicações e palestras sobre a imagem da mulher na mídia e sua influência sobre o imaginário, a naturalização da violência, a imposição de modelos e valores. Atuou no TVER;  Campanha pela Ética na TV;  Observatório da Mulher;  1ª Conferência Municipal, Estadual e Nacional de Comunicação; seminários Mulher e Mídia; organização do seminário nacional “O controle social da Imagem da Mulher na mídia”; Rede Mulher e Mídia, da qual é hoje representante no Conselho Nacional dos Direitos da Mulher;

 Mais recentemente, relaciona as primeiras preocupações e demandas das mulheres, no início do movimento (necessidade de creche de qualidade para as crianças no período de trabalho das mães), com as questões levantadas pelo movimento pela democratização da mídia. Defende um olhar crítico sobre o impacto que a mídia provoca, e alimenta, no imaginário da população, na formação da subjetividade, fortalecendo e legitimando exclusivamente os aspectos que lhes interessam, e incluindo as crianças, vistas como consumidoras e estimuladoras do consumo familiar.

Fale com a autora: contato@rebrinc.com.br

Texto feito especialmente para o site da Rede Brasileira Infância e Consumo, Rebrinc. Caso queira reproduzi-lo, pedimos que mencione a fonte e o autor, com link para o site. Ajude-nos a valorizar os autores e a divulgar o nosso trabalho pela infância.