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Famílias pedem o fim da publicidade infantil

Famílias pedem o fim da publicidade infantil

 

STJ proíbe a Publicidade Infantil – Leia aqui.

 

Pais e mães sabem que é impossível retirar totalmente a pressão para o consumo que existe sobre as crianças. Elas vão estar sempre expostas à publicidade que é direcionada aos adultos. Estarão vendo anúncios na TV, nas revistas, nos ônibus ou mesmo nos pontos de venda, além das conversas com os amigos da escola sobre roupas, brinquedos e alimentos diversos. O que as famílias questionam é a publicidade infantil, que é construída especialmente para convencer a criança e persuadi-la para o consumo de algum produto ou serviço. Por usar elementos do universo infantil, como personagens de desenhos animados, e argumentos feitos especialmente para a criança, esse tipo de publicidade tem um poder muito grande sobre meninos e meninas, razão pela qual movimentos, organizações e famílias pedem o fim da publicidade infantil.

“As crianças são sujeitos sociais ainda em formação e por isso necessitam de atenção especial na regulação não só da publicidade, mas da mídia”, explica Pâmela Saunders, doutora em Comunicação e pesquisadora do Grupo de Pesquisa da Relação Infância, Juventude e Mídia, GRIM, ligado à Universidade Federal do Ceará. “Vários estudos evidenciam que as crianças são mais vulneráveis aos argumentos persuasivos da publicidade. O próprio Conselho Federal de Psicologia argumenta que é preciso esperar, em média, a idade dos 12 anos para que o indivíduo possua repertório cognitivo capaz de liberá-lo, tanto do ponto de vista cognitivo quanto moral, da forte referência a fontes exteriores de prestígio e autoridade”.

Pâmela pesquisa os temas infância, mídia e consumo e explica que esse conceito de abusividade da prática da publicidade infantil já é previsto no Código de Defesa do Consumidor desde 1990 no seu artigo 37. Ele estabelece a proibição de toda publicidade enganosa ou abusiva e é “considerada abusiva, dentre outras, a publicidade que se aproveita da deficiência de julgamento e experiência da criança. E, além disso, o artigo 36 do CDC diz que “a publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como tal”, o que não acontece quando o receptor da mensagem publicitária é uma criança”, lembra a pesquisadora.

Para Pâmela, a resolução 163 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, Conanda, em vigor desde abril de 2014, veio para detalhar melhor e tornar mais evidente esse conceito de abusividade da publicidade infantil. “Respeitar essa resolução é garantir a proteção à infância e contribuir para uma comunicação ética em nosso país”, defende.

Organizações e movimentos, como é o caso da Rede Brasileira Infância e Consumo, Rebrinc, argumentam que as empresas devem, acima dos interesses comerciais, respeitar todas as normas que existem para a proteção da infância, como a Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente, além do Código de Defesa do Consumidor e da resolução 163. As agências de publicidade podem redirecionar para o público adulto, que tem condições para entender as estratégias de marketing, a comunicação mercadológica que hoje é feita para a criança. Desde a sua publicação, há um ano, a resolução 163 incentivou o debate sobre os apelos comerciais sobre a infância mas as empresas continuam desrespeitando a norma, o que gera indignação por parte de pais e educadores.

Proteção da infância

Para Suzana Battistella, pesquisadora e mãe de dois filhos, o principal motivo pelo qual a publicidade infantil é abusiva é o fato da criança não conseguir entender que a intenção da propaganda é vender. “Ela não consegue assistir a uma propaganda de forma crítica. O que elas veem é, para elas, realidade. Se uma propaganda fala que ter uma boneca vai tornar a menina mais querida e mais aceita entre suas amigas, ela vai acreditar.” Na opinião de Suzana, por não ter a capacidade para distinguir um apelo persuasivo e uma informação qualquer, a criança torna-se vulnerável, o que justifica a proteção da infância aos apelos das campanhas publicitárias.

A publicitária e designer Rosiane Pacheco também é contra a publicidade que fala diretamente com a criança. “O direcionamento da publicidade para crianças chega a ser criminoso, se é que podemos dizer assim, pois a criança não tem nenhum filtro crítico. Além disso, a publicidade em tão tenra idade pode ser danosa porque em certa medida ela “cria” consumidores antes até que eles entendam o que isso significa e qual o impacto que isso tem na vida deles.” Rosiane, mãe de um menino de três anos, acha que, com relação a esse apelo na educação dos filhos, o que é ainda pior é que “a nossa publicidade é arcaica e sustenta vícios, preconceitos e ideias que são vendidos culturalmente e que mais prejudicam do que ensinam. O machismo, por exemplo, é um desses elementos presentes na publicidade. Além disso, temos a estratificação social e o pensamento classista e consumista de que o sujeito só é alguém quando tem, quando compra”, completa Rosiane.

Paulo Fernandes, coordenador pedagógico, contador de histórias e pai de um menino, defende que a resolução 163 precisa ser respeitada. “Ela veio ao encontro à necessidade de se cumprir as obrigações em relação aos direitos das crianças e dos adolescentes no Brasil, tratando-as como prioridade”. Ele considera que precisamos garantir o cumprimento de todas as medidas jurídicas que têm como objetivo auxiliar as famílias na criação dos filhos. Para Paulo, é também fundamental o acompanhamento dos pais quando a criança está diante da televisão e de outras telas que têm apelos para o consumo, além do diálogo constante e participação efetiva na criação dos filhos. “As crianças são expostas diariamente à publicidade que se utiliza de personagens e apresentadores infantis, personalidades e associação de prêmios e brindes aos produtos. A publicidade infantil contribui para erotização precoce e influencia diretamente no comportamento das crianças e adolescentes expostos diariamente a mensagens persuasivas. É por isso que eu defendo a necessidade da aplicação da resolução 163 e, mais ainda, de um reforço com a aprovação de uma lei federal sobre o mesmo tema.”

Nicole Bernardes, professora universitária e mãe de três meninas, acha a proibição da publicidade infantil adequada e útil para barrar, ou pelo menos diminuir, a exposição das nossas crianças a anúncios e produtos abusivos. Segundo ela, muitos desses produtos são inadequados e até perigosos para a saúde dos nossos filhos. “Como eles estão na mídia o tempo todo, muitos pais não imaginam que sejam produtos perigosos ou feitos com componentes e matérias-primas prejudiciais. Além disso, estimular um comportamento de consumo desenfreado nas crianças é algo desonesto e cruel, pois elas estão em formação e seu juízo de valores ainda está sendo moldado. Sou completamente a favor da proibição e também de uma maior fiscalização e punição das empresas que estão desrespeitado a lei”, defende Nicole.

Para Ana Cláudia Bessa, cofundadora do Movimento Infância Livre de Consumismo, e mãe de dois meninos, a publicidade infantil tem o intuito de se aproveitar de um cidadão que, pela lei, é considerado incapaz. “São adultos tentando vender direto para as crianças e usando-as para convencer os pais. Os pais dizem não… Muitos nãos… A criança fica entre essa publicidade criminosa que a assedia abusivamente e os pais que lhe tolhem os desejos despertados de forma abusiva e enganosa.” Para Ana Cláudia, os pais protegem os filhos como podem mas a publicidade os massacra. “Precisamos que o Estado defenda as crianças porque a publicidade quer é que a cada dia se assedie mais. Se tem alguém que precisa ouvir um não é a publicidade”, finaliza.

Por Desirée Ruas – Jornalista/Rebrinc

 

Ilustração: Emidio Batista

Ilustração: Emidio Batista

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