Defesa da infância faz aniversário
A Convenção sobre os Direitos da Criança das Nações Unidas completa 25 anos. A Rede Brasileira Infância e Consumo, Rebrinc, escolheu a data para lançar oficialmente seu site e ampliar a divulgação do seu trabalho junto à sociedade. A Rebrinc acredita na importância da divulgação dos instrumentos jurídicos existentes para a proteção da infância e da adolescência. E para que os direitos se tornem realidade para meninos e meninas em todo o mundo é necessário o esforço de toda a sociedade nos mais variados temas.
A necessidade da criação de um documento que pudesse alcançar a eficácia dos direitos da criança fez com que, no Ano Internacional da Criança, em 1979, por iniciativa da Comissão da Polônia, a Comissão de Direitos Humanos da ONU começasse a pensar em um projeto de convenção. Aprovada por unanimidade na Assembleia Geral das Nações Unidas, em 20 de novembro de 1989 e assinada pelo Brasil em 26 de janeiro de 1990 (promulgada em 21 de novembro de 1990), a Convenção sobre os Direitos da Criança é o tratado sobre os direitos humanos mais ratificado na história. Suas diretrizes são oriundas da Declaração Internacional dos Direitos da Criança, que também faz aniversário e completa 55 anos no dia 20 de novembro. A data é considerada pela Organização das Nações Unidas, ONU, o Dia Universal da Criança.
A ampla ratificação da convenção em todo o mundo inaugura uma transformação no estatuto jurídico social da infância. Para a convenção, criança é todo ser humano com menos de 18 anos de idade, a não ser que, em conformidade com a lei aplicável à criança, a maioridade seja alcançada antes. A Convenção foi adotada por todos os Estados, com exceção apenas dos Estados Unidos e da Somália. A ratificação da Convenção exige que o Estado adeque sua legislação aos princípios do documento.
A Convenção, que tem força vinculante, representou uma transformação na forma como a infância era tratada. A concepção do menor, acompanhada de uma visão de compaixão e repressão, dá lugar ao reconhecimento de um sujeito pleno de direitos, cujas opiniões devem ser ouvidas e respeitadas. A Convenção estabelece parâmetros de orientação e atuação política de seus Estados Partes para a efetivação dos princípios nela estabelecidos, para o desenvolvimento individual e social saudável da infância, período fundamental da formação do caráter e da personalidade humana.
Também foram acrescentados protocolos facultativos à Convenção: o Protocolo sobre a Venda de Crianças, Prostituição e Pornografias Infantis; o Protocolo sobre o Envolvimento de Crianças em Conflitos Armados; e o Protocolo que permite que as crianças levem denúncias sobre a violação dos seus direitos à Comissão das Nações Unidas.
O que mudou?
E vinte e cinco anos depois, a pergunta é: o mundo é hoje um lugar melhor para as crianças? Para o Fundo das Nações Unidas para a Infância, Unicef, que levantou a questão para comemorar a data, os indicadores mostram uma melhoria considerável nas condições de vida das crianças. Uma criança nascida em 2014 tem hoje mais chances de viver para além do seu quinto aniversário e também de frequentar o ensino primário do que em 1989. Com relação ao trabalho infantil, o número de crianças entre os 5 e os 17 anos envolvidas na atividade também reduziu cerca de 1/3 desde 2000.
Mas ainda temos muitos desafios a enfrentar para a proteção da infância. A pobreza, os conflitos, a violência, a falta de acesso a serviços essenciais e os diversos tipos de exploração ameaçam nossas crianças em várias partes do mundo. Ainda temos milhares de crianças morrendo por doenças como diarreia, sem acesso a água limpa ou moradia segura.
A má alimentação, por exemplo, é hoje um problema que atinge crianças de todos níveis socioeconômicos. Se, por um lado, temos crianças que não têm acesso à alimentação adequada e ainda morrem de fome, por outro, convivemos com o aumento da obesidade infantil e os problemas decorrentes do excesso de peso. A preocupação com a alimentação infantil é apenas uma das faces do consumismo infantil.
Por que nos preocupamos com a relação infância e consumo?
A atuação da Rebrinc tem como base o questionamento acerca da indução precoce ao consumismo em suas múltiplas facetas. A Rebrinc entende que é preciso respeitar a infância amplamente como um período da vida fundamental para o pleno desenvolvimento do ser humano. Como a criança deve ser protegida de todo tipo de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, como define o artigo 227 da Constituição Federal, o artigo 5º do ECA, e artigos 34 e 36 da Convenção da ONU sobre os Direitos da Criança, de 1989, entendemos que a criança precisa de uma proteção integral que abrange também um olhar atento para a relação infância e consumo.
Em seu artigo 36, a Convenção sobre os Direitos da Criança, define que “os Estados Partes protegerão a criança contra todas as formas de exploração que sejam prejudiciais para qualquer aspecto de seu bem-estar.” A Declaração Universal dos Direitos da Criança também afirma que “a criança, em virtude de sua falta maturidade física e mental, necessita de proteção e cuidados especiais, inclusive a devida proteção legal, tanto antes quanto após seu nascimento”. Sendo assim, usar a criança como alvo de mensagens e de produtos, muitos deles prejudiciais – fazendo uso da sua “falta de julgamento e experiência”, como define o Código de Defesa do Consumidor sobre a publicidade abusiva – é um tipo de exploração sobre a infância. Os apelos para o consumo se aproveitam da vulnerabilidade das crianças e dos adolescentes e vendem, além de produtos e serviços, valores e visões de mundo, interferindo não apenas na saúde física, mas também psicológica e emocional.
Apesar de estamos imersos em uma sociedade de consumo, é possível proteger a criança dos apelos comerciais e dos conteúdos prejudiciais ao seu desenvolvimento, seja publicidade, comunicação mercadológica ou até mesmo de entretenimento? Cada vez mais pessoas e movimentos pela infância defendem que sim e que há alternativas ao consumismo. Proteger a infância do consumo não significa fazer com que as crianças vivam em uma bolha, alheias ao mundo. A sociedade de consumo bombardeia adultos com suas estratégias de marketing e quer fazer o mesmo com as crianças e os adolescentes. Adultos têm condições para entender os objetivos por detrás dos apelos ao consumo. Já as crianças não. Enquanto são inseridas cada vez mais cedo no mundo do consumo, crianças deixam de viver a infância, têm seu desenvolvimento comprometido e aprendem valores e hábitos que não são saudáveis e nem sustentáveis. A reflexão sobre o consumismo na infância é também um alerta sobre os riscos da cultura do consumo para os adultos e o que isso representa para os valores, a sociedade e o planeta.
Saiba mais sobre o tema
Conheça a Convenção dos Direitos da Criança (1989) na íntegra.
Leia a Declaração Universal dos Direitos da Criança (1959)
20 de novembro: o que podemos comemorar – Artigo de Laís Fontenelle
Celebrando os Direitos das Crianças no Brasil e no Mundo em 20 de novembro de 2014 (Blog Descobrincante)