A cantina escolar também é um espaço que educa?
Todos os dias mães, pais e responsáveis se perguntam: o que eu vou enviar para o lanche da escola? De segunda a sexta a cena se repete e a busca por opções saudáveis nem sempre é feliz. Para muitas famílias, a venda de alimentos na escola é uma facilidade que garante a merenda das crianças. Mas e quando as opções à venda não são tão saudáveis quanto gostaríamos? Juliana Abrahão é nutricionista com experiência em cardápios saudáveis para escolas. “Enquanto não temos uma legislação federal que defina critérios para todas as escolas, públicas e privadas, vejo que uma transformação vem acontecendo no ambiente escolar e as cantinas estão melhorando os alimentos ofertados”, enfatiza. Ela lembra que, apesar das mudanças visíveis em muitas cantinas escolares pelo país, ainda há alguns obstáculos à promoção da alimentação saudável nas escolas. “Nas escolas públicas é preciso reivindicar que a alimentação oferecida seja sempre de boa qualidade e na escola privada, no caso da venda, as famílias precisam ficar atentas quanto aos alimentos disponíveis”, explica. Na entrevista a seguir, Juliana Abrahão conta mais sobre a importância das cantinas saudáveis para a tranquilidade das famílias e para a saúde dos alunos.
Na sua opinião, vamos conseguir ter um dia cantinas saudáveis em todas as escolas?
A cantina escolar saudável é possível sim e, mais do que isso, ela é uma necessidade. O atual cenário brasileiro conta com um aumento contínuo de casos de crianças e adolescentes que apresentam excesso de peso e obesidade. Isso tem sido motivo de preocupação das esferas econômicas, sociais e educacionais. As políticas públicas, na intenção de modificar esse quadro, instituíram por meio da Portaria Interministerial nº 1.010 de 8 de Maio de 2006, as diretrizes para a Promoção da Alimentação Saudável nas Escolas de educação infantil, fundamental e nível médio das redes públicas e privadas, em âmbito nacional. Especificamente, no estado de Minas Gerais, a lei nº 15.072 de 05 de abril de 2004 já abordava a promoção da educação alimentar e nutricional nas escolas públicas e privadas do sistema estadual de ensino. Essa lei foi complementada em 04 de setembro de 2009 (Lei nº 18.372) com informações a respeito dos lanches e bebidas fornecidos e comercializados nas escolas, objetivando a promoção da saúde e a prevenção da obesidade infantil.
Apesar da legislação existente em Minas Gerais, ainda não temos cantinas saudáveis em todas as escolas.
A lei já existe em Minas Gerais e a Resolução 1511, da Secretaria Estadual de Educação, regulamentou em 2010 os alimentos que não devem estar à venda nas escolas. Mas muitas escolas particulares ainda argumentam que falta uma legislação específica para suas cantinas. E o impasse ainda persiste nos dias de hoje. Uma lei federal ajudaria a resolver este problema. Mas mais do que leis precisamos é de iniciativas que abracem a causa da alimentação saudável no ambiente escolar.
Qual é o papel da cantina escolar para a promoção da alimentação saudável?
Temos uma variedade de situações quando pensamos em alimentação escolar. Nas escolas públicas temos o oferecimento gratuito da merenda ou a venda em cantinas; nas escolas privadas temos os alunos que levam o lanche de casa, temos os alunos que compram na escola o que vão comer e temos ainda a situação em que todo o lanche é de responsabilidade da escola. Em todas as situações de comércio, a cantina escolar deve ter o compromisso social com a saúde da comunidade escolar na qual ela se insere. Os lanches e produtos que ela comercializa têm enorme importância para um bom desenvolvimento físico, psíquico e social das crianças. Além disso, uma cantina que se preocupa com a saúde da comunidade escolar, a partir da oferta de alimentos adequados e saudáveis, desenvolve a confiança nos pais e alunos.
Na prática, como deve funcionar uma cantina saudável?
A cantina escolar deve comercializar produtos de alta qualidade nutricional, de preferência os de fabricação própria, sem adição final de conservantes e com a melhor composição nutricional possível. Para isso, é possível elaborar produtos saborosos e com níveis moderados de óleo, sal e açúcar, além de ingredientes selecionados como farinhas integrais, gérmen de trigo; grãos e sementes; leite e derivados desnatados; azeite de oliva; carnes magras, dentre outros. Deste modo, ocorre redução nos teores de sódio, sacarose (açúcar simples), gordura saturada e trans, e aumento no teor de fibras, vitaminas e minerais desses alimentos se comparado aos industrializados. A escolha de fornecedores, no caso da venda de produtos industrializados, deve seguir critérios rígidos optando sempre por aqueles com melhor composição nutricional e qualidade higiênico-sanitária. Com isso, a cantina deve excluir a venda de refrigerantes, frituras e massas de salgados ricas em gorduras como as folhadas, dentre outros alimentos não saudáveis. Em resumo, a cantina escolar deve ter como missão a promoção de saúde a partir da oferta de alimentos saudáveis, saborosos e de excelente qualidade aliados à educação alimentar e nutricional.
Para fortalecer o vínculo positivo entre a educação e a saúde é muito importante que a alimentação também seja considerada uma atividade educativa, contribuindo para a construção de um ambiente saudável, melhorando a educação e o potencial de aprendizagem de toda comunidade escolar. A escola torna-se o espaço educacional e social propício para promover a saúde. Para que isso ocorra, faz-se necessário que a mesma tenha como objetivo a formação de cidadãos críticos e reflexivos, que saibam fazer escolhas adequadas, de forma responsável. E é nesse ambiente de educação que está inserida a cantina escolar, tendo um papel fundamental como estimuladora de hábitos alimentares saudáveis e influenciadora na formação do indivíduo. Devemos nos perguntar: a cantina escolar também é um espaço que educa? Ela não é um negócio à parte dentro da escola. Ela integra o ambiente escolar porque está ali ao alcance das crianças, sem a intermediação dos seus responsáveis. Pensando assim, o ideal é que a cantina tenha uma postura de oferecer as melhores opções para os alunos em termos nutricionais. E a escola também pode orientar as famílias quanto ao lanche que é enviado de casa. A busca pela alimentação saudável deve acontecer de todas as formas.