Com sumo ou sem sumo
* Por Corinne Julie Lopes – advogada e gestora social
Há pessoas e instituições que ainda não acreditam na intrínseca relação entre violência e consumo ou não dão a essa relação a devida importância. Para mim, essa relação foi sempre clara e, recentemente, tem aparecido de forma declarada também na discussão sobre a não redução da maioridade penal.
Se formos analisar os dados do sistema socioeducativo de Minas Gerais, perceberemos, por meio de números oficiais (segundo fontes do Centro Integrado de Atendimento ao Adolescente Autor de Ato Infracional – CIA/BH), que 68% dos atos infracionais cometidos por adolescentes resumem-se a quatro categorias: uso e tráfico de drogas e roubo e furto. Dessas quatro categorias, 26,6% referem-se à questão das drogas (uso e tráfico) e, quase o dobro, 43,7% dos atos infracionais, corresponde a roubos e furtos.
Ora, pensando que viemos caminhando para um padrão mínimo de vida com estratégias de erradicação da miserabilidade, os furtos e roubos não devem ser considerados tão somente para aquisição de alimentos. Há uma questão de aquisição de drogas aí a ser considerada mas, o que se percebe concomitante a essa realidade, é a premente necessidade de consumir padrões e estilos de vida onde a visibilidade desses adolescentes possa se tornar um pouco mais significativa.
Vivemos um apelo consumista constante. Você sai de sua casa e, mal chega à esquina da rua, depara-se com milhares de letreiros, vitrines e outdoors dizendo que é preciso consumir. Faça um esforço e tente passar um dia sem comprar algo. É praticamente impossível. Se não estamos comprando, estamos pagando algo: conta de luz, de internet, de telefone (ou seja, indiretamente, está-se comprando tudo isso). Hoje em dia até existe o “Dia sem Compras”. Imaginem só. Não comprar é exceção, esforço. É se sentir sem sumo; sem poder. É ser diferente de todo mundo.
Cada vez mais, o consumo está introjetado em nossa cultura e, dessa forma, na vida de crianças e adolescentes. Minha própria enteada estranha quando vamos a Feiras de Gratidão ou Feiras de Troca (“como assim não usaremos dinheiro?”)
Assim sendo, já que dele não podemos nos afastar completamente, o que é algo muito utópico para se pensar atualmente, precisamos pensar em formas sustentáveis e conscientes de consumo. É preciso por em prática uma educação para o consumo. Ressignificar o consumo desenfreado; pensar nas possibilidades de vida sem nos deixar ser conduzidos pelo capitalismo atroz que rodeia a todos.
Por tudo isso, nosso sumo deve ser outro. Nosso discurso deve ser: mais educação, menos prisão para os adolescentes. E educação para o consumo deve estar na linha de frente dessa discussão…
* Saiba mais sobre a colunista Corinne Julie Lopes
Meu nome é Corinne Julie. Sou de Conselheiro Lafaiete, moro atualmente em Belo Horizonte mas já visitei e morei em outros mares e montanhas… Assim como o significado do meu nome, sou cor, magia e alegria. Amante de livros, fotografias e boas viagens, encontrei na Rebrinc, espaço para algumas inquietações minhas. Sou advogada, gestora social e mediadora de conflitos. Sócia-fundadora do CEDECA MG (Centro de Defesa da Criança e do Adolescente) e mestre em Educação, Gestão Social e Desenvolvimento Local. Acredito que boas ideias e várias atitudes podem mudar o mundo.
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Texto feito especialmente para o site da Rede Brasileira Infância e Consumo, Rebrinc. Caso queira reproduzi-lo, pedimos que mencione a fonte e o autor, com link para o site. Ajude-nos a valorizar os autores e a divulgar o nosso trabalho pela infância