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A Turma da Mônica em uma campanha pelo consumo consciente?

A Turma da Mônica em uma campanha pelo consumo consciente?

Por Maria Belintane Fermiano (Doutora em Educação e Especialista em Educação para o Consumo) e Ana Carolina dos Santos (Professora de Educação Infantil). Integrantes da Rede Brasileira Infância e Consumo – REBRINC 

 

Como educadoras e profissionais atuantes em movimentos que questionam o consumismo na infância sempre buscamos elementos que nos ajudem a trabalhar o tema em sala de aula. Recentemente, tivemos a oportunidade de ler as duas primeiras cartilhas que fazem parte de uma campanha de consumo consciente, protagonizadas pela Turma da Mônica para uma cidade da Região Metropolitana de São Paulo.

Não se discute aqui a competência do Maurício de Sousa, criador dos personagens da Turma da Mônica e, muito menos, os bons momentos que milhares de crianças e adultos passam com a leitura de suas histórias. Aliás, é essa trajetória que solidifica, diante da sociedade brasileira, a credibilidade dos personagens.

Mas, é exatamente por isso que nos manifestamos. Acreditamos que utilizar de personagens para vender inúmeros produtos de utilidade duvidosa para crianças não é honesto, pois as crianças acreditam “no personagem” e não possuem discernimento a respeito dos verdadeiros interesses em jogo. Da mesma forma, também não aprovamos a associação dos mesmos personagens, como “marca” de maçãs, pois o princípio é o mesmo. O marketing dos produtos da Turma é direcionado às crianças e conversa com elas e isso é contra a Resolução 163/2014 do Conanda.

Aliás, é pública a manifestação do Maurício de Sousa sobre a “burrice” da proibição da publicidade infantil, criticando a Resolução 163 e que essa restrição geraria uma perda de 33 bilhões de reais na economia.

Considerado esse posicionamento, a presença da Turma da Mônica em uma campanha como essa em escolas é, no mínimo, incoerente. A mesma Turma que incentiva o consumo consciente, estampa seus personagens em centenas de tipos diferentes de produtos. Além disso, não há nas embalagens qualquer tipo de orientação sobre seu descarte correto e o impacto no meio ambiente.

Talvez seja exatamente por isso que nessa campanha pelo “consumo consciente” não há orientação de como “saber a procedência dos produtos” e nem como descobrir se as “empresas são responsáveis”. Seria dar um “tiro no pé”, não é verdade?

Outros conceitos equivocados também aparecem no material como “viver em um sítio é uma paz”, vida saudável, ar puro, tranquilidade, há relações de trocas entre os “sitiantes”. A cartilha não fala das dificuldades do produtor rural, dos atravessadores, dos defensivos agrícolas… Aliás, passa a ideia de que o produto cultivado com carinho é o melhor. Uma mensagem que parece romântica e enganosa.

Se não fosse o suficiente, em outra história, a personagem principal, Mônica, influi diretamente no poder de compra do pai, a partir de uma propaganda vista no celular, o que demonstra a grande influência da publicidade sobre as crianças.

Esses materiais foram entregues às escolas. Não se sabe quais foram as orientações de como o professor deve utilizá-los. Portanto, fica aqui o alerta de que, sem discussão, a campanha torna-se sem sentido e vira pretexto para mais uma forma de exposição da Turma da Mônica às crianças.

Diante do contexto, é ético vender quinquilharias e alimentos com os personagens porque as crianças querem ter a Turma por perto? É ético que os bonecos e um sem fim de produtos com a Turma sejam produzidos em empresas que não garantem os direitos trabalhistas de seus empregados? É ético não orientar como descartar produtos quando a Turma toda “defende” a natureza? É ético não apresentar a realidade vivida pela população brasileira seja como produtor rural ou como um consumidor?

E o que você, educador, pensa sobre o tema? Fale com a REBRINC.