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Precisamos de uma escola que faça tudo?

Precisamos de uma escola que faça tudo?

Por Silvia Adrião – Diretora pedagógica da Scuola Italiana Eugenio Montale (SP) e integrante da Rede Brasileira Infância e Consumo

 

Ao ler uma matéria num jornal digital sobre uma escola que oferece serviço de “faz tudo” para os pais, resolvi propor uma reflexão. O texto dizia que, além das crianças ficarem um período de doze horas na escola, ela se ocupa de preparar todas as refeições e até congelados para os alunos comerem nos finais de semana. Cuida até das roupas e do corte de cabelo dos seus alunos. Confesso que fiquei muito triste. As justificativas da escola são pautadas no tempo de qualidade com as crianças. Dizem que, cuidando destas coisas, sobra tempo para os pais fazerem outras… Não quero aqui fazer uma crítica ou desqualificar a escola e as famílias que optam por isso. Quero apenas deixar um convite para pensarmos o que importa e o que faz diferença na formação das crianças.

Faz diferença escolher com carinho o sabor e a composição dos pratos que, juntos, vão saborear. Faz diferença escolher o dia e o lugar para cortar o cabelo. Até aquela caprichada na hora de deixar o uniforme o mais limpinho possível. Estamos complicando a infância e o jeito de sermos pais e mães. Estamos distanciando pais e filhos, rompendo vínculos que se constroem pela cumplicidade da convivência “complicada” justamente por ser compartilhada, como escreveu Renata Adrião.

Estamos tornando nossas relações comerciais demais. Estamos desvirtuando o papel da escola e sua maior contribuição que é a de estar e aprender com o outro para além da própria família. Estamos colocando preço em atos de afeto, ou não é um ato de afeto preparar uma papinha para seu bebê?

A relação com a criança deve ser sim pautada pela qualidade, mas a qualidade está na convivência, no mais simples ato do fazer cotidiano. Qualidade só não basta. Criança também precisa de quantidade. Ela quer e precisa brincar sozinha com seu carrinho, mas ciente de que seu pai e/ou sua mãe está logo ali, na sala, lendo um jornal ou organizando um armário. Ela quer e precisa de quantidade, de mãe e/ou pai fazendo um bolo, enquanto ela faz um desenho ou ajuda com os ingredientes. Ela precisa saber que é prioridade na vida de alguém. Que alguém deixa de fazer muitas coisas para ficar com ela. Porque ela importa! Porque estar com ela, cuidar dela e das coisinhas dela importam!

Absolutamente nada substitui o papel da família. A família, no seu fazer cotidiano, transmite a seus filhos, de modo direto e indireto, uma série de valores que serão profundamente interiorizados e que vão ser determinantes para o indivíduo no futuro. Tudo passa tão rápido. Logo ela crescerá e os pais terão tempo de sobra para os seus afazeres. E o que ficou?

 

Foto: Pixabay

 Colunista Rebrinc - Silvia Adrião

Saiba mais sobre a colunista Silvia Adrião:

Sou pedagoga, especialista em Construtivismo/Educação e Mestre em Sociologia da Educação.Tenho mais de 20 anos de experiência no trabalho com crianças e na defesa da cultura infantil. Sou pesquisadora e apaixonada por Literatura infantil e pela abordagem de ensino Italiana de Reggio Emilia. Encontrei na Rebrinc um espaço para ampliar o debate e o alcance das reflexões sobre infância.

Fale com a autora: contato@rebrinc.com.br